Aeroportos sem demanda, mas com verba da união

Auditoria do Tribunal de Contas da União nos 97 aeroportos regionais que contam com verba federal em todo o país constatou que, em Minas, há sete dessas pistas a menos de 100 quilômetros de distância de outros aeródromos de cidades polo, o que as torna deficitárias. Em três outros aeroportos, houve super estimativa de quase 1.500% na demanda de voos regulares pela população do município.

Diante da falta de consistência na seleção dos aeroportos incluídos no Plano de Aviação Regional e do fato de que 95,2% dos municípios selecionados já possuem aeródromos, o TCU avalia que o maior risco é o desperdício de dinheiro público, que pode chegar a R$ 3,3 bilhões. Segundo o Tribunal, de 60 a cem aeródromos no Brasil incluídos no programa “dificilmente terão voos regulares, a médio e longo prazo”, o que revela investimentos “potencialmente inadequados ou superdimensionados”.

Dados de março de 2012 apontam que 79% da população nacional encontrava-se a menos de 100km de um aeroporto com voo regular e sem justificativa que embasasse a escolha. Norma do Parlamento Europeu (Regulamento UE 1.315/2013) estabelece que investimentos somente são autorizados se os aeroportos regionais estiverem fora do raio de 100 km de outro existente, a não ser que se comprove demanda significativa de passageiros, no caso deles, correspondente a pelo menos 0,1% do volume total anual de passageiros dos aeroportos da União Europeia.

Como o movimento anual nos aeroportos na União Europeia é de cerca de 1,5 bilhão de passageiros, isso significa que é necessária uma demanda superior a 1,5 milhão de passageiros/ano para que seja autorizado investimento em aeroporto a menos de 100 km de outro.

No Brasil, o movimento anual de passageiros é da ordem de 200 milhões. Aplicando o mesmo percentual da norma europeia, teríamos 200 mil passageiros/ano como linha de corte. No caso dos aeroportos incluídos no plano, considerando a demanda de 2012, apenas 20 aeroportos superam essa movimentação.

“Há fortes indícios de que houve um excesso de aeroportos incluídos no plano. Tem o risco de realização de investimentos em infraestruturas ociosas e que futuramente terão que ser mantidas e operadas sem um uso que a justifique”, afirmou o relator do processo, ministro Marcos Bemquerer Costa.

No lançamento do programa elaborado pela Secretaria Nacional de Aviação Civil da Presidência da República (SAC/PR), em dezembro de 2012, o custo médio estimado para cada investimento em aeroporto do Programa era de R$ 27 milhões, fora os custos com desapropriação.

A equipe técnica de fiscalização verificou, ainda, que, em todo o país, não houve fundamentação técnica consistente para selecionar 270 cidades beneficiadas pelo plano regional de aeroportos. Foram detectadas a ausência de critérios de priorização de investimentos, de Planos Diretores Aeroportuários, de Planos Básicos de Zona de Proteção de Aeródromos e de planos para desapropriações. O relator recomendou à SAC/PR que reavalie as localidades contempladas no plano, que só vai ser apreciado em 2015, levando-se em conta o risco de desperdício de recursos e a inclusão de aeroportos a menos de 100 km um do outro. A Secretaria de Aviação Civil diz que escolha das regiões é ‘tecnicamente fundamentada’

A Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC) defendeu o plano de aeroportos regionais alegando que o processo de seleção dos locais foi feito com base em metodologia “tecnicamente fundamentada”, com a consulta a diversas esferas de governo, entre elas, o Ministério do Planejamento, o Ministério do Turismo e a Casa Civil. O órgão citou também que consultou “profissionais e acadêmicos”, além de representantes das companhias aéreas, que não foram especificadas.

O relator do processo do TCU, ministro Marcos Bemquerer, disse que o documento apresentado pela SAC não faz referência a essas consultas a especialistas, nem mesmo da “contribuição concreta” na seleção final dos aeroportos.

Em relação ao critério de distância de 100km entre aeroportos, a SAC discordou da recomendação do Tribunal de Contas para que seja reavaliada a seleção dos aeroportos do programa. Segundo a Secretaria de Aviação, “não se pode limitar os investimentos nos aeródromos contemplados no Plano de forma a atender apenas a aviação, sob o risco de ferir o princípio da isonomia, impondo tratamento diferenciado a diversos grupos da população”. A SAC apresentou alguns exemplos de países que têm aeroportos regionais a menos de 100 km de outro em sua malha aeroportuária atual, entre os quais Austrália, Noruega, Estados Unidos e Suíça.

Ainda de acordo com a SAC, estudos preliminares levaram a Pasta a desistir de ampliar os aeroportos de Santa Vitória do Palmar (RS), de Piracicaba (SP), de Rio Claro (SP). A Pasta destacou também que o plano de aeroportos regionais é voltado “essencialmente, a promover melhorias e aproveitamento da infraestrutura existente”.

Fonte: Hoje em dia
21/12/2014
Foto: Frederico Haikal/Hoje em Dia

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